Hoje acordei meio triste.
Não sei ao certo por quê. Uma casa vizinha sofreu um roubo. Um andaime e um
tambor de 210 litros de água. Eram meus incumbes, mas ficavam por lá desde que
a minha “obra” estreou. Mas não me parece que este seja o motivo da minha
tristeza. Porque já estava triste mesmo quando o sono profundo estava no auge.
Estava triste quando fui-me deitar no dia anterior. Estava triste tanto quanto
estou hoje. Talvez a história do andaime e do tambor tenha acrescido uns dois
porcento da minha tristeza.
Ainda assim, faço agora os
cálculos das perdas e cheguei a conclusão que os valores rondam os 7000 Mt
(sete mil meticais), são valores acima do salário mínimo. Agora sim, estou mais
triste porque perdi bens que valeram moedas significativas. Com estes valores
compraria brios ou ajudaria na civilidade dos meus filhos e assim combater a iliteracia
e a pobreza. Tenho quase certeza que os larápios irão despachar em troca de
“soldier”, “Zed” ou “Tentação “ para alimentar os seus vícios e estimular mais
roubos. Deste modo vão contribuindo para a aceleração da pobreza e a atenuação
do progresso.
No entanto o que originou a
minha tristeza não tem nome. Não sei como designar. É uma legião de factores
detractores. Estou triste porque a minha tristeza não tem razão aplausível. Ora
vejamos. No meu sono profundo tive dois sonhos impressionantes. A seguir passo
a contar a história de cada um dos sonhos. São apenas sonhos e não realidades,
porquanto não me ajuízem.
No primeiro sono profundo
sonhei com dois senhores. Ambos eram adultos, cujas idades situam-se entre 50 e
65 anos aproximadamente. Um chamava-se Nitira e o outro chama-se Quetu. Estes
senhores tinham posses e influenciavam o destino do seu país. Não me lembro o
nome do país, mas no meu sonho via ambiente confuso feito de florestas,
planícies, planaltos, prédios e cabanas a pau-a-pique. Assuntos de actualidade
e que nutriam as manchetes dos jornais estavam referidos estes senhores. Tanto
o Nitira como o Quetu são pessoas sem arduidades, e por isso são da classe
alta. No entanto, quando os Deudis do Quetu entrassem em acção, este senhor era
irreconhecível. Ele devorava tudo. Queria tudo do Nitira. Queria tudo da Patuleia.
Era capaz de açoitar ou mesmo trucidar pessoas. Ele vivia no reino do “Quero
Tudo”.
E os mesmos Deudis lembravam
ao Nitira que ninguém lhe devia tirar nada. O Nitira por sua vez, vivia no
reino ao lado, o reino de “Ninguém me Tira”. O Nitira não partilhava nem tão
pouco a sua riqueza ou ideias com o Quetu e muito menos com a Patuleia. Os dois
sores tinham algo em comum: todas as suas acções e ideias eram implementadas em
nome da Patuleia. Assim, a Patuleia era a pessoa sofredora das acções do Nitira
e do Quetu. Além disso, a Patuleia é uma pessoa mísera que lhe falta quase
tudo.
Quando a Patuleia se constituía
para resolver o problema dos reinos “Quero Tudo” e “Ninguém me Tira”, eis que a
pipi me desperta e convida-me para atende-lo. A tristeza começou a dar cabo de
mim, porque sabia que a solução estava por perto e que os dois reinos se
uniriam num só. Mas deixemos para lá, é apenas um sonho.
No meu regresso da micção,
um segundo sono bem profundo dá cabo de mim. Desta vez sonhei com a Patuleia.
Foi um sonho com alguns cenários não muito claros e portanto não posso
lembrar-me de todos detalhes de forma nítida. A Patuleia dificilmente usa a
viatura pessoal nos princípios e meados do mês. Serve-se da boleia ou dos
serviços de transporte de passageiros para se deslocar ao posto de trabalho.
Quando chega ao fim do mês recebe a sua recompensa em forma de moedas. Nesse
dia de salário a Patuleia não pensa noutra coisa senão em compensar os trinta
dias que passou falido. Neste dia de recompensa, a Patuleia abastece o carro
“full tank”, passa da esquina dos humburguers,
pizza ou carne para matar a fome e saudades de uma beer. Se é no meio de semana, a Patuleia vai a tempo de chegar a
casa no mesmo dia. Se for sexta-feira, o risco de chegar a casa no domingo é
catastrófico.
Enquanto bebe, a Pauleia
pega no volante. Quanto mais bêbedo fica mais esperto se torna ao volante. As
garrafas ou latas pequenas de bebidas, e os diversos resíduos são espalhados
pela estrada e ruas adentro. O som do carro está num volume ensurdecedor. E as
conversas giram em torno dos senhores Nitira e Quetu, os quais são aludidos
como os progenitores de todos os problemas do seu país.
Já em casa, a Patuleia
depara-se com um cenário de penúria. Falta tudo. Falta gás, carvão, arroz,
peixe, feijão, sabão, óleo, caldo e sal. E a família tomou apenas uma refeição
por dia desde a sexta-feira. A roupa está suja e não há como lavar. A Patuleia
é uma pessoa nervosa e já quer implicar com a família. Ora “não me chateia”,
ora “estou sem mola” são algumas das expressões que se ouvem. Tudo porque a Patuleia
não sabe como gastou toda a sua recompensa. E ainda tem contas a pagar, dos
empréstimos contraídos com os agiotas.
A Patuleia decide então
endividar-se ainda mais, contraindo empréstimos com outros agiotas com dois
propósitos principais: pagar dívidas antigas e comprar mantimentos básicos para
a casa. E ainda restar com algumas moedas para gerir “chapa-cem” ou “my-love”.
Este cenário é cíclico, e acontece em todos os meses. Actualmente a recompensa
da Patuleia não é suficiente para liquidar todas as dívidas e por isso entrou
num ciclo vicioso de endividamento.
O meu telemóvel tocou irritamente.
Era o meu vizinho que queria comunicar-me sobre o roubo do andaime e do tambor.
Espertei. A minha tristeza agravou-se nesse instante porque o vizinho negou-me
a oportunidade de acompanhar o desfecho da história da Patuleia. Estou triste.
Mas são sonhos. Contudo, os sonhos podem se tornar realidade e por isso irei
aprender e investigar formas de como prevenir e resolver este tipo de problemas
antes dos mesmos chegarem ao meu país.
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